quarta-feira, 24 de agosto de 2011

A alimentação como fator de proteção ao câncer

Nossos genes se constituíram há muitas centenas de milhares de anos, na época em que éramos caçadores e colhedores. Eles se adaptaram ao meio ambiente de nossos ancestrais, e especialmente às suas fontes de alimentos. Só que nossos genes evoluíram muito pouco 1 e, hoje como ontem, nossa fisiologia espera uma alimentação semelhante à que tínhamos quando comíamos os produtos da caça e da colheita: muitos legumes e frutas, de tempos em tempos algumas carnes ou ovos de animais selvagens, um equilíbrio perfeito entre os ácidos graxos essenciais (ômega -6 e ômega 3) e muito pouco açúcar ou farinha (a única fonte de açúcar refinado para nossos ancestrais era o mel, sendo que eles não consumiam cereais).

Hoje, os estudos nutricionais ocidentais revelam que 56% de nossas calorias provêm de três fontes que não existiam no momento em que nossos genes se desenvolveram 2:
- os açúcares refinados (açúcar de cana, de beterraba, de xarope de milho, de frutose, etc.
- as farinhas brancas (pão branco, massas brancas, arroz branco, etc.);
- os óleos vegetais (soja, girassol, milho, óleos hidrogenados).

Contudo, essas três fontes não contêm nenhuma proteína, nenhuma vitamina, nenhum dos minerais, nenhum dos ácidos graxos ômega – 3 essenciais ás funções do organismo. Por outro lado, parece que de fato elas alimentam diretamente o crescimento de um tumor de câncer.

No entanto uma série de alimentos se consumidos regularmente e numa quantidade adequada podem prevenir ou até mesmo auxiliar as pessoas em quimioterapia a vencer os tumores. São eles:

- Chá verde
Rico em polifenóis como as catequinas, particularmente a epigalocatequina – 3 – galato (EGCG), que reduz o crescimento de novos vasos necessários ao crescimento dos tumores e metástases. É também um poderoso antioxidante, desintoxicador (ativas as enzimas do fígado que eliminam as toxinas do organismo) e um facilitador da morte das células cancerosas por apoptose.

A liberação das catequinas necessita de uma infusão prolongada, pelo menos cinco a oito minutos, de preferência dez minutos.

Utilização recomendada: macerar 2g de chá verde durante dez minutos em um bule de chá e consumir na próxima hora (se passar deste tempo os polifenóis desaparecem). É recomendável de 3 a 6 xícaras por dia. 3

- Gengibre:
A raiz de gengibre age também como poderoso antiinflamatório, antioxidante (mais eficaz, por exemplo, do que a vitamina E) e contra certas células cancerosas.
Uma infusão de gengibre pode ser utilizada para reduzir a náusea que acompanha a quimioterapia ou a radioterapia.

- Legumes crucíferos:
As couves (de bruxelas, chinesa, brócolis, couve –flor, etc.) contêm sulforafane, glucisinolatos e índole -3 – carbinol (I3C), que são poderosas moléculas anticâncer. O sulforafane e os I3C têm a capacidade de desintoxicar certos cancerígenos. Eles impedem a evolução de células cancerosas em tumores malignos. Agem também favorecendo o suicídio das células cancerosas. 4, 5, 6.

A melhor maneira de cozinhar estes vegetais é colocá-los em água já fervente, pelo tempo de aproximadamente 3 minutos e com a panela destampada para que não percam suas propriedades e realcem sua cor.

-Alho, cebola, alho – poro e cebolinha:
Os compostos sulfúreos dessa família (os “aliáceos”) reduzem em parte os efeitos cancerígenos das nitrosaminas e compostos N – nitroso que se formam sobre as carnes excessivamente grelhadas, ou durante a combustão do tabaco. Induzem a apoptose (morte) das células do câncer de cólon, de mama, de pulmão, de próstata e da leucemia. Os estudos epidemiológicos sugerem uma redução dos cânceres de rim e próstata nas pessoas que mais o consomem.

Observação: as moléculas ativas do alho são liberadas durante o esmagamento dos dentes e são mais bem absorvidas se forem diluídas em um pouco de óleo.

- Legumes e frutas ricos em caroteno:
Cenoura, batata –doce, diferentes tipos de abóbora, caqui, damasco. Eles possuem vitamina A, que têm capacidade comprovada de inibir a progressão de células cancerosas de diversas linhagens, algumas das mais agressivas.


- Tomate:
O licopeno do tomate está associado a um aumento da sobrevida de homens com câncer de próstata que fazem pelo menos duas refeições por semana com molho de tomate. 7

O licopeno estimula a multiplicação das células do sistema imunológico e aumenta sua capacidade de atacar as células tumorais.

Atenção: para tornar o licopeno disponível, é preciso que os tomates sejam cozidos (como no molho de tomate, sendo que sua absorção melhora com as gorduras (como o azeite de oliva extra virgem)).

- Cogumelos:
Os cogumelos shitake, maitake, enokitake, cremini, portobello, champigon de Paris e pleurotes (ou cogumelos ostra) possuem lentinan, que estimula a multiplicação e a atividade das células imunológicas. São frequentemente utilizados no Japão como acompanhamento da quimioterapia para apoiar o sistema imunológico.

- Ervas e condimentos:
As ervas de cozinha, como o alecrim, o tomilho, o orégano, o manjericão e a hortelã, são muito ricas em óleos essenciais (aos quais elas devem o sabor) da família dos terpenos.

Elas aumentam a apoptose (morte) das células cancerosas e reduzem sua proliferação, bloqueando as enzimas necessárias à invasão dos tecidos vizinhos.

O carnosol do alecrim é também um poderoso antioxidante e antiinflamatório. Sua capacidade de aumentar a eficácia de certas quimioterapias está demonstrada, inclusive em linhagens de células cancerosas que se tornam resistentes ao tratamento.

A salsa e o aipo contêm epigenina, que é antiinflamatória e induz a apoptose de células cancerígenas.


- Frutas vermelhas:
Morango, framboesa, mirtilo e amora contêm ácido elágico e múltiplos polifenóis. Eles estimulam os mecanismos de eliminação dos cancerígenos. As antiocianidinas e proantocianidias facilitam também a apoptose das células cancerosas.

- Frutas cítricas:
Laranja, tangeria, limão contêm flavonóides antiinflamatórios. Eles estimulam também a intoxicação dos cancerígenos pelo fígado.

- Vinho tinto:
O vinho tinto contém numeroso polifenóis dentre os quais o famoso resveratrol. Como esses polifenóis são extraídos por fermentação, sua concentração é mais importante no vinho do que no suco de uva. Como provêm da casca e das sementes da uva, eles estão muito menos presentes no vinho branco.

O resveratrol age sobre os genes conhecidos por proteger as células sadias do envelhecimento (sirtuins). Tem também a capacidade de retardar as três etapas da progressão do câncer – iniciação, promoção e progressão – bloqueando a ação do NF – kappa B. 8,9

Dose recomendada: esses resultados são observados com concentrações comparáveis às obtidas pelo consumo de um copo de vinho tinto por dia (um consumo diário superior não é recomendado, pois provoca, de acordo com algumas pesquisas, um aumento de cânceres).

-Chocolate amargo:
O chocolate amargo (mais de 70% de cacau) contém numerosos antioxidantes, proantocianidias e muitos polifenóis (um pedaço de chocolate contém duas vezes mais destas substâncias do que um copo de vinho tinto e quase a mesma quantidade do que uma xícara de chá verde em infusão). Essas moléculas retardam o crescimento das células cancerosas e limitam a angiogenêse.

ATENÇÃO: a mistura do chocolate e do leite anula os efeitos benéficos das moléculas contidas no cacau.

- Vitamina D:
A vitamina D é fabricada pela pele durante a exposição ao sol. Sabe-se hoje em dia que um aporte suficiente de vitamina D reduz consideravelmente o risco de desenvolver diversos cânceres diferentes. 10 Vinte minutos de exposição ao sol de meio dia sob a maior parte do corpo, já seria suficiente para uma adequada produção de vitamina D (mas atenção aos perigos da superexposição).


- Ômega -3:

Os ômega -3 de longa cadeia presentes nos peixes gordos (ou nos óleos de peixe de boa qualidade) reduzem a inflamação. Em cultura, retardam o crescimento das células cancerosas de um amplo leque de tumores (pulmão, mama, cólon, próstata, rim, etc.).

Agem também reduzindo a disseminação de tumores sob a forma de metástases. Numerosos estudos em seres humanos mostram que o risco de diversos cânceres (cólon, mama, próstata, ovário) é consideravelmente reduzido em pessoas que comem peixe pelo menos duas vezes por semana. 11, 12

As sementes de linhaça são ricas em ômega -3 vegetais (de “cadeia curta”) e em lignanas. Esses fitoestrógenos reduzem a atividade nefasta dos hormônios sobre o crescimento do câncer e talvez também sobre a angiogênese. Em um estudo recente de Duke, o consumo diário de 30g de sementes de linhaça moídas retarda o crescimento dos tumores de prostátata de 30 a 40%. 13


- Probióticos:

O intestino contém normalmente bactérias “amigas” que participam de forma útil da digestão e da regularidade do trânsito intestinal. Também desempenham um papel importante no equilíbrio do sistema imunológico. Dentre as mais comuns, encontram-se o Lactobacillus dophillus e o Lactobacillus bifidus.

Foi demonstrado que os probióticos inibem o crescimento das células cancerosas do cólon. A aceleração do trânsito intestinal reduz também o risco de câncer de cólon ao limitar o tempo de exposição do intestino aos cancerígenos trazidos pela alimentação. Os probióticos desempenham também um papel de desintoxicação. 14 Os iogurtes com probióticos são uma boa fonte.

E certos alimentos são pré – bióticos, ou seja, eles contêm polímeros de frutose que estimulam o crescimento das bactérias probióticas. Trata-se do alho, cebola, do tomate, do aspargo, da banana e do trigo.



REFERÊNCIAS:
1. Eaton SB, Konner M. Paleolithic nutrition. A consideration of its nature current implications. New England Journal of Medicine 1985; 312 (5): 283-9.

2. Cordain L, Eaton S, Sebastiab A et al. Origins and evolution of the Western diet: health implications for the 21 st century. American Journal of Clinical Nutrition. 2005; 81 (2): 341- 54.

3. Servan- Schreiber, David. Anticâncer: Prevenir e vencer usando nossas defesas pessoais. 1º ed. Rio de Janeiro: Objetiva, 2008.

4. Cover CM, Hsieh SJ, Cram EJ et al. Índole -3- carbinol and Tamoxifen cooperate to arrest the cell cycle of MCF -7 human breast câncer cells. Cancer Research. 1999; 59 (6): 1244 – 51.

5. Jaga K, Duvvi H. Risk reduction for DDT toxicity and carcinogenesis through dietary modification. Journal of the Royal Society of Health 2011. 121 (2): 107 -13.
6. Gamet – Payrastre L, Li P, Lumeau S et al. Sulforaphane, a naturally occurring colon cancer cells. Cancer Res 2000; 60 (5): 1426 -33.

7. Chan JM, Holick CN, Leitzmann MF et al. Diet after diagnosis and the risk of prostate cancer progression, recurrence, and death (United States). Cancer Causes & Control. 2006. 17 (2): 199 – 208.

8. Kaeberlein M, Mc Donagh T, Heltweg B et al. Substrate – specific activation of sirtuins by resveratrol. J. Biol Chezm. 2005; 280 (17): 1738 -45.

9. Manna SK, Mukhopadhyay A, Aggarwal BB. Resveratrol suppresses TNF – induced activation of nuclear transcription factors NF – [kappa] B, activator protein -1, and apoptosis: potential role of reactive oxygen intermediates and lipid peroxidation. J. Immnunol. 2000; 164 (12): 6509- 19.

10. Lappe JM, Travers – Gustafson K, Davies KM, Recker RR, Heaney RP. Vitamin D and calcium supplementation reduces cancer risk: results of a randomized trial. American Journal of Clinical Nutrition. 2007; 85; 1586 91.

11. Gago – Dominguez M, Yuan J, Sun C, Lee H, Yu M. Opposing effects of dietary n -3 and n -6 fatty acids on mammary carcinogenesis; The Singapore Chinese health study. British Journal of Cancer. 2003; 89 (9): 1686 -92.

12. Terry P, Lichtenstein P, Feychting M, Ahlbom A, Wolk A. Fatty fish consumption and risk of prostate cancer. The Lancet 2001; 357 (9270): 1764- 6.

13. Flaxseed stunts the growth of prostate tumors. DukeMedNews. 2007.

14. Wollowski I, Rechkemmer G, Pool – Zobel BL. Protective role of probiotics and prebiotics in colon cancer. Am J Clin Nutr. 2001; 73 (2): 451S -5.


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